Como já foi discutido no artigo que diferencia os conceitos de desigualdade e iniquidade, a realidade independe da forma como a interpretamos. Ou seja, dar nome a um fenômeno social ajuda no processo da sua compreensão, mas ela for equivocada, o fenômeno não se alterará, apenas será visto de uma forma incorreta.
Por esta razão é muito importante que saibamos designar corretamente os diversos fenômenos sociais que ocorrem em nossa sociedade e que muitas vezes são problemas a serem superados.
Nos últimos anos as desigualdades têm estado no centro do debate público e permeado diversas agendas. Muito se fala, por exemplo, de desigualdades de renda, desigualdades no mercado de trabalho, desigualdades educacionais, e assim sucessivamente.
Também não é incomum ouvirmos no noticiário que a pobreza tem aumentado e que por isso as pessoas têm experienciado situações de maior vulnerabilidade.
Ambos os fenômenos são problemas sociais nos quais se presume que há um grupo de indivíduos que está em uma situação de desvantagem, ou seja, que requer maior priorização.
No entanto, ambos os problemas são de natureza distintas, e apesar de poderem se sobrepor, um não decorre necessariamente do outro.
Por outro lado, a relevância de ambos os problemas, não só no Brasil, mas no mundo, os garantiram destaque na Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU), que criou os 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS).
O ODS número 1 é “erradicação da pobreza”, enquanto o ODS 10 é “redução das desigualdades”.
Para compreender melhor cada um desses conceitos recorremos a duas palavras-chave que são bem sugestivas a respeito dos que eles representam.
Tamanho
Em termos agregados, no nível de um país, a pobreza normalmente está relacionada à baixa disposição de recursos de um país. Por isso dizemos que a pobreza está relacionada ao tamanho, que alegoricamente poderia se referir ao “tamanho do bolo”.
Neste sentido, um conjunto de indivíduos pode estar em uma situação de desvantagem, ou vulnerabilidade, em virtude da ausência de disposição de recursos que podem suprir as suas necessidades básicas.
Em termos individuais, uma pessoa está em uma situação de pobreza quando ela possui um nível de renda inferior ao patamar determinado como sendo o mínimo para que ela atenda minimamente às suas necessidades.
Há também um patamar ainda menor do que o da pobreza, que é denominado de extrema pobreza.
Distribuição
Por outro lado, a situação de desvantagem e vulnerabilidade de um conjunto de indivíduos também pode estar atrelada à distribuição dos recursos que estão à disposição para serem repartidos, o que denota o fenômeno das desigualdades.
Utilizando a alegoria do bolo, as desigualdades dizem respeito à forma como o bolo será distribuído entre as pessoas. Essa distribuição pode ser igualitária, de modo que todos recebem fatias do mesmo tamanho, ou pode ser desigual, quando alguns recebem uma fatia maior do que os outros.
Considerando que o tamanho do bolo já está dado e não pode ser alterado, para que alguém receba uma fatia maior, é necessário que outra pessoa receba uma fatia menor.
Apesar de nem todas as desigualdades serem injustas, parece ser pouco razoável, por exemplo, que um bolo dividido em 10 fatias tenha cerca de 7,6 fatias destinadas para uma única pessoa. Em 2021, os 10% mais ricos do mundo detinham cerca de 76% da riqueza global.
Tanto a pobreza quanto as desigualdades são problemas sociais a serem combatidos.
Pelo lado da pobreza, deve-se garantir que as pessoas disponham minimamente de condições básicas para viver, de modo que ninguém precise viver abaixo deste patamar.
Pelo lado das desigualdades, deve-se garantir uma distribuição de recursos (renda e riqueza) justa para que um grupo de pessoas não tenha excessivamente mais do que o necessário enquanto outro grupo de pessoas não disponha nem do mínimo necessário.
O desenvolvimento social dos países passa não apenas pela quantidade de riqueza que eles produzem, mas também pela forma como essa riqueza é distribuída e se reflete no bem-estar da sua população.